Voto deixa de ser nominal em conselho de experiências com animais

Por Maurício Tuffani
Funcionária com cães mantidos em cativeiro no Instituto Royal, que realiza pesquisas de medicamentos (Imagem: Danilo Verpa/Folhapress)
Funcionária com cães mantidos em cativeiro no Instituto Royal, que realiza pesquisas de medicamentos (Imagem: Danilo Verpa/Folhapress)

As decisões do Concea (Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal) não serão mais realizadas por meio de declaração dos votos de seus conselheiros. O novo regimento interno desse órgão, publicado na sexta-feira (2.mai) no “Diário Oficial da União”, estabelece que deixam de ser nominais e passam a ser quantitativas as deliberações sobre credenciamento de instituições e normas para uso de animais em atividades de pesquisa e ensino.

Nas votações quantitativas, todos os votos semelhantes são manifestados ao mesmo tempo, por exemplo, com os participantes levantando as mãos. O motivo da mudança foi a necessidade de agilizar o andamento das reuniões do conselho, que possuem uma pauta muito extensa de deliberações, segundo a assessoria de comunicação do MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação).

Agilizar reuniões

De fato, votações nominais tornam muito demoradas as sessões de órgãos colegiados com muitos assuntos a serem debatidos e decididos. Mas é de se esperar que o argumento da agilização de reuniões não convença os ativistas que se opõem ao uso de animais em pesquisas. Esses militantes e seus grupos certamente entenderão o fim da votação nominal no Concea como um obstáculo para a tática de fazer marcação cerrada sobre a atuação dos conselheiros.

Antes que os mais extremistas dessa militância comecem a acusar o Concea de ter adotado o voto secreto, é preciso deixar claro que não é nada disso. As pessoas presentes a votações quantitativas têm como saber quem se posicionou contra, a favor ou se absteve, e gravações de imagens podem registrar esses posicionamentos. Além disso, as manifestações dos conselheiros só poderiam passar a ser secretas se o regimento tivesse estabelecido isso claramente, o que não aconteceu.

Membros do conselho

Presidido pelo ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, o Concea é integrado por representantes desse ministério e das pastas da Educação, da Saúde, do Meio Ambiente e da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e também do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).

Além dessas sete participações governamentais, o Concea também tem oito membros das entidades não governamentais SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), ABC (Academia Brasileira de Ciências), Crub (Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras), Fesbe (Federação das Sociedades de Biologia Experimental), SBCAL (Sociedade Brasileira de Ciência em Animais de Laboratório), Febrafarma (Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica) e duas sociedades de proteção de direitos dos animais.

Prazos e síntese

Houve outras alterações importantes e positivas na regulamentação interna do Concea vigente desde março de 2010. Assinada no dia 30 de abril pelo ministro Clélio Campolina Diniz, que assumiu em 17 de março a pasta da Ciência, Tecnologia e Inovação, a portaria 460 estabeleceu a ampliação de 5 para 15 dias do prazo máximo para órgãos federais solicitarem participação em reuniões para tratar de assuntos de seu interesse, mas sem direito a voto.

Também foi definida na nova norma a obrigação de o Concea publicar uma síntese de suas deliberações em seu no site no prazo de até cinco dias após a reunião em que elas foram aprovadas. O trâmite de processos no órgão passou a ter maior detalhamento de seus fluxos, o que permite

Aviso a outros órgãos

O fluxo para processos no Concea ficou mais detalhado e com etapas mais definidas, e isso gera pelo menos dois fatores positivos para a qualidade dos seus serviços. O primeiro consiste em reduzir as chances de encaminhamentos indevidos de documentos, que atrasam os trabalhos e comprometem prazos. O segundo é possibilitar melhores condições para o acompanhamento do trâmite de pedidos de credenciamento de instituições de pesquisa e de outras solicitações.

Os trâmites administrativos do conselho ficaram mais bem definidos não só para o registro de entidades de pesquisa, mas também para procedimentos de apuração de responsabilidades e para recursos contra indeferimento de pedidos de credencimento de laboratórios. Outro acréscimo relevante foi a obrigação de o Concea notificar outros órgãos de fiscalização do governo sobre os casos de negativas de solicitações de credenciamento, em vez de esperar que eles leiam essas informações no “Diário Oficial”.

Ilegalidade

No mesmo dia em que alterou o regimento interno do conselho de experimentação animal, o governo também publicou a resolução normativa 16/2014, que reduziu o número de documentos exigidos para credenciamento de instituições de pesquisa e ensino que usam seres vivos com sistema nervoso dorsal, exceto humanos. Desse modo, a entrega das demais informações foi deixada para a etapa posterior de licenciamento das atividades de produção, manutenção e uso de animais em atividades de ensino e pesquisa.

Ao comentar essa simplificação do registro de entidades de em uma nota no site do MCTI , o coordenador do Concea, José Mauro Grangeiro, afirmou que os processos de credenciamento, que duram em media 180 dias, serão reduzidos para cerca de 45 dias. Segundo o dirigente do conselho, são pouco mais de 70 as instituições credenciados e há cerca de 170 em credenciamento. Mas, estimando em aproximadamente 400 o total de entidades que usam animais em ensino e pesquisa, ele afirmou sobre elas:

“Temos que colocá-las na legalidade e trabalhar em cima da fiscalização, da visita, da análise, para então detectar necessidades de melhoria em função da lei. (…) Se elas estão ocultas, todo mundo perde, e não é esse o objetivo.”

Pressão de ativistas

Após as controvérsias que cresceram no final do ano passado com a invasão do Instituto Royal, em São Roque (SP), por ativistas de proteção dos animais, o Concea voltou a ser pressionado no início deste ano por esses grupos a partir de uma petição da organização não governamental Humane Society International (HSI) para o banimento de ensaios em animais para cosméticos.

Em reunião em 20 de março, o conselho negou o banimento solicitado e aprovou a proposta de sua Câmara Temporária Métodos Alternativos Substitutivos de “substituição progressiva e segura dos testes com animais por métodos alternativos validados”. Conforme nota em 28 de março, o conselho,

“(…) por entender que a questão é mais ampla, recomendou que a substituição não se limitasse aos experimentos relacionados a produtos cosméticos e alcançasse toda a cadeia de compostos de produtos químicos

“Para os métodos alternativos validados reconhecidos pelo Concea, fica proibida a utilização de animais, após cinco anos de aprovação do referido método. Este período é necessário para que a infraestrutura laboratorial e os recursos humanos estejam adequados e capacitados para a realização dos ensaios substitutivos. Os métodos alternativos devem ser executados corretamente para não colocar em risco a saúde humana, a dos próprios animais e o meio ambiente.”

Posições extremas

A polêmica sobre a proteção de direitos dos animais e as pesquisas realizadas com eles é mais um tema cujo debate tem sido prejudicado principalmente nas redes sociais pelo acirramento de posições. Do lado dos ativistas, não têm faltado por parte dos mais extremistas demonstrações de renúncia a qualquer possibilidade de debate. Em contrapartida, não têm sido raros os casos de cientistas cujas culturas de trabalho ainda se encontram na estaca zero da substituição de seus métodos  por práticas já endossadas por pesquisadores e instituições com grande credibilidade.

Em muitas polêmicas cada um dos lados tem suas razões. Mas, em todas as controvérsias, os pólos antagônicos mais extremos podem chegar ao ponto de não ter nenhuma razão. No tema dos direitos dos animais, parece que esse limite já foi superado.