Aqui em São Paulo, enquanto diminuem as águas do sistema Cantareira, aumenta a quantidade de índices para medi-las. Desde segunda-feira, dia 19, as pessoas que vivem na região abastecida por esse conjunto de reservatórios operados pela Sabesp têm à sua disposição três indicadores diferentes para acompanhar diariamente o nível do volume de água armazenado.
Essa fartura de indicadores sobre uma mesma quantidade de água começou na quinta-feira, dia 15, quando o armazenamento do sistema era avaliado em 8,2% tanto pela Sabesp como pelo GTAG (Grupo Técnico de Assessoramento para Gestão) do Cantareira, mais conhecido como comitê anticrise, que é integrado por representantes da ANA (Agência Nacional de Águas), do DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado), da Sabesp e dos comitê das bacias do Alto Tietê e dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí.
O percentual anunciado naquele dia correspondia aos 80 milhões de metros cúbicos armazenados então, levando em conta a capacidade total acima das tubulações de captação, que era de aproximadamente 982 milhões de metros cúbicos. Abaixo desse nível, havia cerca 510 milhões de metros cúbicos da reserva conhecida como volume morto.
Uso da reserva
Naquela quinta-feira, a companhia do governo estadual começou a usar 182 milhões de metros cúbicos dessa reserva para aumentar o volume disponível do sistema Cantareira e prorrogar o esgotamento que vinha se tornando cada vez mais próximo devido à longa estiagem que se arrasta desde abril do ano passado.
Realizado por meio de obras que custaram R$ 80 milhões de recursos estaduais, o remanejamento fez com que o aumentasse para 262 milhões de metros cúbicos o armazenamento disponível para abastecimento, e, para 1,164 bilhão de metros cúbicos, a capacidade útil do sistema.
Calculado com base nesses dois novos dados de volumes, o percentual de armazenamento do sistema no dia seguinte (sexta-feira, 16) deveria, em princípio, aumentar para 22,5%. No entanto, nas primeiras horas daquela manhã, as pessoas que haviam adquirido o hábito de consultar a página “Situação dos Mananciais”, da Sabesp encontraram para o Cantareira o registro de 26,7%.
Primeira divergência
Essa duplicidade do percentual de volume armazenado começou efetivamente no sábado, quando o GTAG Cantareira, que não havia se manifestado no dia anterior, publicou seu boletim. No documento, que já registrava uma ligeira diminuição do volume armazenado, constava a correspondência desse dado com o percentual de 22,3%, como mostra a tabela a seguir.
Nesse mesmo dia, a Sabesp divulgou seu indicador de 26,5%, mas somente pela imprensa, pois a página “Situação dos Mananciais” havia deixado de funcionar desde o final da manhã do dia anterior. (E não voltou a operar até a publicação deste post nesta quarta-feira. Segundo a companhia, a interrupção se deve a problemas técnicos que deverão ser resolvidos, mas ainda não há previsão de data para isso.) [Atualização de 25 de maio: a página “Situação do Mananciais” voltou a funcionar.]
Sem histórico
Na segunda-feira (19) a Agência de Notícias da Sabesp começou a divulgar o primeiro de seus boletins diários com o mesmo título “Situação dos Mananciais” da página ainda descontinuada. Assim como o serviço anterior, o novo também informa o volume armazenado e a pluviometria (medida das chuvas) do dia anterior, a acumulada no mês e a média histórica do mês dos seis sistemas que abastecem a Região Metropolitana de São Paulo. (Os outros cinco são Alto Cotia, Alto Tietê, Guarapiranga, Rio Claro e Rio Grande.) Mas esse informativo não tem a ferramenta que na página agora sem acesso permitia verificar esses dados para datas desde 1º de janeiro de 2003.
A primeira edição desse informativo permitiu compreender que a companhia realmente passou a calcular o famigerado percentual levando em conta o acréscimo do volume morto ao armazenamento para abastecimento, mas sem considerar a expansão da capacidade útil total. O boletim trouxe o seguinte quadro.
Fonte: Sabesp, Agência de Notícias, 19.mai
A triplicidade do indicador de volume armazenado do sistema Cantareira se estabeleceu nessa mesma segunda-feira, quando a imprensa começou a noticiar a duplicidade. Nesse dia, o comitê ligado à ANA emitiu boletim apresentado em duas versões. Uma delas, assim como as edições do sábado e do domingo, considerava os volume úteis total e armazenado com o acréscimo de parte do volume morto. A outra versão, por sua vez, não considerou o aumento para a capacidade útil total nem para o armazenamento disponível, ou seja, deu continuidade ao mesmo procedimento de cálculo que vinha sendo feito até o dia 15 pela Sabesp e pelo GTAG.
Desse modo, podemos escolher qual indicador nos agrada mais —ou nos desagrada menos:
- o da Sabesp, que considera o acréscimo do volume morto ao armazenamento, mas não leva em conta esse aumento na capacidade útil dos reservatórios;
- o do GTAG Cantareira, que se baseia nesse aumento para os volumes armazenado útil e útil total; e
- o do GTAG Cantareira, que não considera o acréscimo do volume morto e continua o mesmo modo de calcular adotado pelos dois órgãos até o dia 15, quando o índice era de 8,2%.
Na tabela a seguir estão os resultados desde segunda-feira desses três indicadores que, em princípio, medem a mesma coisa.
Segundo a Sabesp e a ANA, não há divergência entre esses índices. De acordo com os dois órgãos, são indicadores válidos que dependem apenas da forma de cálculo.
Realmente, aqui em São Paulo temos mais escolhas! Mas essa oferta pode durar pouco tempo, pois, se não houver chuvas, esses três índices ficarão igualados ao alcançarem o zero.
Correção (22.mai, 12h30) – No segundo parágrafo deste post foi substituído o trecho no qual constava que o comitê anticrise é vinculado à ANA (Agência Nacional de Águas). Essa afirmação não é incorreta, mas não é completa, pois o citado grupo é vinculado também a outros órgãos. A alteração foi necessária porque a redação anterior atribuía total responsabilidade pelos dados do grupo à agência federal. As menções ao órgão foram substituídas também na última tabela, que atribuía erroneamente os dados à ANA.