Novos mistérios do volume morto

Por Maurício Tuffani

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Apesar do título, este post se refere a uma história de suspense, e não de terror, pelo menos por enquanto. Não bastasse a situação dramática de rios e reservatórios de água no Estado, o governo de São Paulo e a Sabesp não têm tratado o assunto com a transparência necessária para uma adequada mobilização da sociedade. Mesmo agora, já tendo sido consumidos 69,7 milhões do total de 182,5 milhões de metros cúbicos do volume morto do sistema Cantareira em uso desde 15 de maio.

A Sabesp prefere mostrar essa situação de outro jeito em seu site, como mostra a imagem a seguir, da página “Situação dos Mananciais”.

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Fonte: Sabesp, Situação dos Mananciais

Eu já havia tratado sobre esse assunto em meus posts  “Os três percentuais do sistema cantareira” (21.mai) e O morto da discórdia do sistema Cantareira” (23.mai). Nesse segundo texto apontei mais uma divergência entre a Sabesp e o Grupo Técnico para Assessoramento de Gestão do Sistema Cantareira (GTAG Cantareira), mais conhecido como comitê anticrise.

400 ou 511?

Expliquei que desde que se começou a cogitar o uso do volume morto do Cantareira, a Sabesp e o próprio governo do Estado vinham afirmando que havia 400 bilhões de litros nessa reserva estratégica, mas que segundo os boletins diários do comitê, o dado era de 510,9 bilhões de litros. Ao ser questionada sobre essa diferença, a companhia paulista inicialmente respondeu por escrito o seguinte.

“O volume total da Reserva Técnica (Volume Morto) é de 400 bilhões de litros de água. Poderão ser utilizados 182,5 bilhões de litros desse volume, sendo a diferença entre eles o que sobraria na referida reserva.  No entanto, cabe salientar que atualmente vem sendo consumido o volume disponível no Sistema Cantareira, independentemente do volume de água que  poderá vir a ser utilizado da Reserva Técnica que só deverá ser utilizado caso a estiagem se agrave.”

Após eu insistir com um pedido de posicionamento sobre a divergência, a resposta da estatal foi:

“A Sabesp não irá discutir os critérios de aferição do volume do Sistema Cantareira por meio da imprensa e aguarda a realização da reunião do GTAG para definir a metodologia mais apropriada para tal objetivo.”

Em 25 de julho, pouco mais de dois meses após essas respostas, voltei a questionar a Sabesp para saber o que teria sido resolvido sobre essa divergência no GTAG, que é integrado por representantes da ANA (Agência Nacional de Águas), do DAEE Departamento de águas e Energia Elétrica do Estado), da Sabesp e dos comitês das bacias do Alto Tietê e do PCJ, formada pelos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. À noite recebi a resposta por telefone, de que não havia disparidade nenhuma entre a companhia e o GTAG e que os 400 milhões de metros cúbicos se referiam somente a duas das cinco represas do sistema Cantareira, a Juqueri/Jaguari e a Atibainha.

400 ou 438?

Mesmo assim, a divergência continua, pois é 438,6 milhões de metros cúbicos a soma de dos 239,4 milhões do reservatório Juqueri/Jaguari com os 199,2 milhões do Atibainha,​ com base ​n​os boletins diários expedidos pelo GTAG Cantareira.

Essa diferença de 38,6 milhões de metros cúbicos não é nada desprezível. Corresponde a pouco mais de um quarto (25,7%) de toda a água consumida desde 15 de maio, quando começou a ser disponibilizado o volume morto.

Os 38,6 milhões correspondem em média, a 20 dias de consumo desde 15 de maio. E também a pouco mais de um quinto (21,1%) dos 182,5 milhões da parte do volume morto em uso. Por isso voltei a questionar a Sabesp sobre a divergência que ainda persiste.

Sem resposta

Até o fechamento deste post, a Sabesp não ​respondeu, apesar de eu ter reiterado o pedido. Nem a Agência Nacional de Águas, do governo federal, para a qual perguntei se o órgão tem alguma atribuição institucional relacionada a essa divergência de dados. E, mesmo que não tenha, poderia ter imposto condições sobre isso em julho, quando prorrogou o prazo de vigência da outorga de direito de uso do Sistema Cantareira para a Sabesp.

Pior seria se a diferença fosse a menos do que a Sabesp e o governador Geraldo Alckmin têm afirmado. Embora comprometa a confiabilidade da estimativa da empresa, o dado maior joga em favor do PSDB, que administra o estado há 16 anos e tem sido acusado por oposicionistas de falta de planejamento para o risco da prolongada estiagem.

É muito estranha essa atitude do governo do Estado, que evita dar detalhes e repete como um mantra a afirmação de que garante o abastecimento de água até a chegada das chuvas. Ainda mais porque o assunto não diz respeito somente à parte da região metropolitana de São Paulo abastecida pelo sistema Cantareira, mas também a cidades como Campinas, Piracicaba e tantas outras que também fazem uso da bacia do PCJ.