A Fundação SOS Mata Atlântica enviou ofício à SMA (Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo), solicitando acesso aos dados da pasta sobre o que resta de cobertura vegetal nativa na área de bacia hidrográfica do sistema Cantareira —não confundir com a área de toda a serra de mesmo nome—, que fornece água para cerca de 9 milhões de habitantes da região metropolitana de São Paulo.
A SMA contestou a estimativa da fundação de que atualmente restam 48,8 mil hectares, ou seja, 21,5% dos 227 mil hectares originais de Mata Atlântica nessa área, mostrada em minha reportagem “Desmatamento há 30 anos ainda prejudica sistema Cantareira, diz ONG”, publicada nesta quinta-feira (9.out) na Folha. Com base em dados de seu Inventário Florestal, a secretaria estadual afirmou que a cobertura vegetal nativa nessa região teria aumentado de 41,8 mil hectares para 64,6 mil hectares de 2005 a 2010.
Como se referem a uma situação que pouco teria mudado nos últimos 30 anos, os números da SOS indicam que em todo esse período pouco se conseguiu em resultados de recuperação das áreas degradadas de Mata Atlântica do sistema Cantareira, agravando a capacidade de produção de água de seus mananciais (ver tabela a seguir).
Respostas
O ofício dirigido ao secretário Rubens Rizek tem tom amigável. Procurei a SMA, que por meio de sua assessoria de imprensa afirmou que somente por meu contato ficou sabendo da existência do ofício da fundação, e que aguarda recebê-lo. (Atualização: a ONG informou nesta sexta-feira, dia 10, às 12h41, que já recebeu convite de Rizek e já está agendando o encontro na secretaria sobre os dados das áreas remanescentes.)
A Sabesp afirmou em nota que participa “ativamente” dos comitês de bacia hidrográfica desse sistema de abastecimento e que lançou em 2008 o programa “1 Milhão de Árvores no Cantareira”, superando em menos de dois anos a meta inicial de 1,25 milhão de mudas plantadas. Além disso a empresa afirmou:
“Cabe destacar também que a Sabesp estabelece parcerias com várias instituições visando o plantio de espécies nativas em áreas de sua responsabilidade, mantém dois viveiros florestais e desenvolve ações voluntárias educativas e de recomposição da vegetação.”
Não basta
O problema é que esses esforços, assim como os da ANA (Agência Nacional de Águas), informados na mesma reportagem, não têm alcançado resultados à altura das necessidades de recuperação do potencial hídrico do sistema Cantareira. Inclusive supondo que os dados mencionados pela SMA sejam mais precisos que os da SOS. Com disse em seu ofício Marcia Hirota, diretora-executiva da SOS Mata Atlântica,
“Mesmo que tenha ocorrido a recuperação apontada pela Secretaria do Meio Ambiente, o que será constatado em análise comparativa entre os dois levantamentos, ainda é grande o déficit de cobertura florestal nesses municípios, o que indica a necessidade de ações urgentes do Governo do Estado no sentido de promover a restauração florestal dessas áreas, proteger os mananciais e implantar instrumentos econômicos, como o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), destinados aos proprietários de terras, municípios e Unidades de Conservação que os preservarem.”
Enquanto isso, a situação mostrada sem os percentuais artificiosos da Sabesp é a seguinte: na primeira semana de junho se esgotou o volume útil conjunto de 981,5 bilhões de litros dos cinco reservatórios do Cantareira. Depois passou a ser consumida a reserva de 182,5 bilhões de litros do chamado volume morto bombeada a partir de 15 de maio (mais informações no post “Um dia especial do gráfico desinformativo da Sabesp”, de 20.set).
Nas primeiras horas desta quinta-feira, segundo dados do portal da ANA, restavam 31,8 bilhões de litros, ou seja, aproximadamente um quinto de toda a água do volume morto consumida desde o início de junho.
Enfim, mesmo que chova antes de esse resto acabar e que também o governo conclua as obras do sistema São Lourenço, ainda assim será preciso ampliar, e muito, não só na região da Cantareira, mas em todo o Estado e em todo o país, os remanescentes dessa floresta cuja extensão devastada de mais de 87% é um dos principais retratos de todos os cinco séculos da história do Brasil.