Este post traz informações complementares a minha reportagem “MEC nega que Capes abrirá edital que anunciou em outubro”, publicada pela Folha nesta sexta-feira (21.nov).
Essa matéria menciona a nota oficial do Ministério da Educação (leia a íntegra do documento abaixo) que afirma que a agência subordinada à pasta não pretende publicar edital para seleção de publishers estrangeiros para editar revistas científicas brasileiras, diferentemente do que foi afirmado por participantes da reunião de apresentação do Projeto de Internacionalização de Periódicos Brasileiros no do dia 29 de outubro, em Brasília.
A nota do ministério também contradiz a Capes ao afirmar que o projeto levaria “tão somente à hospedagem e visibilidade” das revistas científicas brasileiras. No convite da agência aos editores-chefes de periódicos para essa reunião constava que nela os publishers apresentariam propostas de “produção, hospedagem e visibilidade” (clique aqui para ler o convite).
Segundo a nota do MEC, não há definição de orçamento da Capes para o projeto nem modelo de edital em formatação, e as propostas apresentadas pelos publishers —cujos custos foram mostrados somente em reuniões privadas de cada um deles com a direção do órgão— serviriam “para cada acordo que eventualmente estabelecessem com os editores nacionais”. O ministério acrescenta que “a opção de aceitar propostas das editoras internacionais é de exclusiva decisão de cada revista brasileira, que achar por bem trabalhar desta forma”.
Propostas
Para quem quiser conhecer as propostas dos publishers, é possível consultar no site da Capes as apresentações da Elsevier (Holanda), Emerald (Reino Unido), Springer (Alemanha) e Wiley (Estados Unidos) —todos com escritórios no Brasil— e Taylor & Francis (Reino Unido). Os cinco documentos incluem serviços de produção editorial, hospedagem e divulgação —e não somente “hospedagem e visibilidade”, como afirma a nota do MEC—, mas não indicam os custos que foram mostrados nas reuniões em separado (clique nos links para ver as apresentações).
Vale notar que consta na página 11 da apresentação da Wiley a “seleção da Capes de 100 periódicos”, confirmando justamente o que seria o propósito do edital a ser publicado após o primeiro, conforme editores-chefes de revistas e publishers participantes do evento já haviam afirmado para a reportagem de 31 de outubro indicada acima.
A Capes divulgou o projeto em seu site com a matéria “Internacionalização da produção científica é tema de reunião do Portal de Periódicos”.
A Abec (Associação Brasileira de Editores Cientificos) e a base de dados brasileira SciELO (Scientific Electronic Library Online) enviaram na segunda-feira (17.nov) ofício conjunto à Capes. O documento pediu a suspensão do projeto e afirmou que essa iniciativa deveria ser conduzida em “contexto de transparência e competitividade”.
Aspectos legais
Antes dessa reportagem, a Capes não havia respondido a nenhuma das perguntas que encaminhei ao elaborar duas outras matérias e um post, que são os seguintes.
- “Capes anuncia projeto de internacionalização de revistas brasileiras” (31.out)
- “Editores científicos criticam projeto de internacionalização da Capes” (14.nov)
- “Manifesto de editores pede suspensão de projeto da Capes” (19.nov)
Dessa vez o MEC respondeu por meio de nota à Folha após questionamento à Capes sobre as implicações legais das reuniões fechadas com cada um dos publishers. Odete Medauar, professora titular de direito administrativo da USP, afirmou à reportagem não haver ilegalidade até agora porque ainda não existe nenhum edital, mas ela aponta incompatibilidade desses procedimentos em separado com o princípio da publicidade da administração pública.
“Causa estranheza que a Capes não tenha realizado chamada pública de publishers, mesmo que suas propostas tenham sido solicitadas para uma sondagem para o projeto e que os custos delas tivessem sido apresentados também a todos os editores-chefes de revistas”, disse Odete Medauar nesta sexta-feira, referindo-se à reunião realizada pela agência na parte da manhã do dia 29, quando a iniciativa foi anunciada.*
De acordo com a docente da Faculdade de Direito da USP, a agência federal terá de ser plenamente transparente sobre o que foi abordado nessas apresentações aos editores-chefes da revistas e nas reuniões em separado com os publishers, qualquer que seja a forma que escolherá para conduzir sua iniciativa.*
* Parágrafos acrescentados às 22h30 de sexta-feira (21.nov). Até esse horário, o Ministério da Educação e a Capes não se posicionaram sobre essas considerações, que foram encaminhadas às suas respectivas assessorias de imprensa no mesmo dia às 16h.
Íntegra da nota oficial do Ministério da Educação
Como é de conhecimento geral, a CAPES, atendendo demanda de editoras nacionais, organizou no dia 29 de outubro uma reunião pública com os editores de revistas científicas brasileiras, os quais compareceram espontaneamente para discutir com representantes de editoras estrangeiras a possibilidade de editoração de revistas brasileiras de acesso livre por editoras internacionais. Compareceram 71 editoras nacionais e 5 editoras internacionais (Emerald, Springer, Elsevier, Taylor & Francis e a Wiley). Os representantes das editoras internacionais tiveram a oportunidade de apresentar uma exposição pública sobre suas características e sua proposição para aceitar o compromisso de editoração das revistas brasileiras.
Destaque-se que nas propostas apresentadas, as editoras internacionais esclareceram que o acervo das revistas brasileiras não passaria a fazer parte do acervo da editora internacional, ficando a revista sob a plena responsabilidade da editoria nacional. O acordo levaria tão somente à hospedagem e visibilidade da revista brasileira.
Na parte da tarde, cada uma das editoras apresentou aos membros do Conselho Consultivo do Portal de Periódicos (PAAP) e à Direção da CAPES, suas propostas e custos para cada acordo que eventualmente estabelecessem com os editores nacionais.
Assim, a CAPES esclarece que a opção de aceitar propostas das editoras internacionais é de exclusiva decisão de cada revista brasileira, que achar por bem trabalhar desta forma. A título de exemplo, menciona-se que várias revistas chinesas e algumas brasileiras já operam neste modelo.
Não há, neste momento, nenhuma decisão tomada pela CAPES para impor tais acordos e muito menos qualquer definição quanto ao orçamento para esta ação, bem como inexiste um modelo de edital em formatação, o que só ocorrerá se e quando editores de revistas brasileiras manifestarem junto à CAPES interesse nesse modelo de atuação. Portanto, não há que se falar em licitação ou concorrência.
A CAPES atua e continuará atuando, juntamente com o CNPq, no financiamento de revistas brasileiras, através do Programa de Editoração. Atualmente, 198 revistas, a um custo de R$ 6 milhões/ano são financiadas pelas duas agências.
Ressalta-se que a CAPES só passou a apoiar o financiamento do Programa de Editoração a partir do ano 2007.