Cientistas acusam muita discussão e pouca ação na crise hídrica

Por Maurício Tuffani
Trecho do reservatório Cachoeira, do sistema Cantareira. Imagem: Maurício Tuffani/Folhapress
Trecho do reservatório Cachoeira, do sistema Cantareira. Imagem: Maurício Tuffani/Folhapress/28.out.2014

Assinada por 15 cientistas reunidos na capital Paulista no final de novembro e divulgada na semana passada, a “Carta de São Paulo” alerta que há “muita discussão e pouca ação” por parte de órgãos municipais, estaduais e federais em face da ameaça à segurança hídrica da população da região Sudeste, especialmente da Região Metropolitana de São Paulo, do interior de Minas Gerais e do Estado do Rio de Janeiro.

Todos os habitantes dessa região devem estar preparados para estiagens cada vez mais extremas, pois “são fortíssimos os indícios de que há uma mudança climática em curso”, segundo o documento redigido ao final do simpósio “Recursos Hídricos na Região Sudeste: Segurança Hídrica, Riscos, Impactos e Soluções”, promovido pela Academia Brasileira de Ciências (ABC) e realizado no Instituto de Botânica (IBt), órgão da Secretaria do Meio Ambiente do Estado.

De acordo com a carta,

“A crise hídrica, influenciada pelas alterações climáticas e hidrológicas, é agravada pelas mudanças no uso do solo, pela urbanização intensa, pelo desmatamento em regiões de mananciais e, principalmente, pela falta de saneamento básico e tratamento de esgotos, aumentando a vulnerabilidade da biota terrestre e aquática e das populações humanas.”

Os signatários do documento ressaltam a necessidade de modificações imediatas no sistema de governança de recursos hídricos, destacando que são necessárias mudanças abrangentes no sistema de governança dos recursos hídricos. O texto destaca:

“Temos um sistema fragmentado, em que muito se discute sobre “quem manda” no uso dos recursos hídricos e pouco se decide sobre o que fazer, muito menos sobre quem tem a responsabilidade de realizar o que quer que tenha sido decidido. O resultado é muita discussão e pouca ação. Quando todos são responsáveis, ninguém é responsável.”

Signatários

Entre os especialistas que assinaram o documento há pesquisadores que exerceram ou ainda ocupam importantes cargos governamentais. O coordenador do texto, José Galizia Tundisi, membro da ABC e professor aposentado da USP, foi presidente do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) de 1995 a 1998. Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e membro da ABC, é secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).

Também assinou a carta Jerson Kelman, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que foi diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) de 2005 a 2008 e diretor-presidente da Agência Nacional de Águas (ANA) de 2001 a 2004. E Luiz Pinguelli Rosa, diretor do Programa de Planejamento Energético da COPPE/UFRJ e membro da ABC, presidente da Eletrobrás (Centrais Elétricas Brasileiras) de 2003 a 2004.

Divulgação e transparência

Além de mudanças na governança de recursos hídricos, a carta alerta também para a necessidade não só de ações urgentes para a divulgação e a conscientização da sociedade, mas também de transparência

“Somente a transparência e a mobilização podem evitar uma maior instabilidade social, que corre o risco de acontecer se o abastecimento público continuar sendo drasticamente afetado, como indicamos dados científicos e as informações existentes.”

A íntegra do documento, com a relação completa dos pesquisadores e também de outros participantes do seminário, entre eles, promotores de meio ambiente e pareceristas do Ministério Público do Estado de São Paulo, está disponível no site da ABC.