Acostumado há algumas décadas a acompanhar e resenhar obras de divulgação científica de autores estrangeiros, desta vez tenho a rara oportunidade de comentar e, acima de tudo, de recomendar um excelente livro de um brasileiro sobre a física moderna. E, para tornar a notícia ainda melhor para o leitor, o livro é gratuito — pode ser baixado livremente pela internet.
“História da Física: Artigos, ensaios e resenhas”, é uma coletânea de textos de divulgação escritos nos últimos 20 anos por Cássio Leite Vieira, editor da área internacional da revista “Ciência Hoje”, um dos melhores jornalistas do Brasil na área de ciência.
Além do rigor da informação, a linguagem dos textos reunidos no livro é simples, didática e direta. Inclusive quando o assunto é daqueles mais cabeludos e distantes do dia a dia das pessoas. Por exemplo, a descoberta em 2012 da partícula subatômica que rendeu no ano seguinte o Prêmio Nobel de Física ao britânico Peter Higgs, como mostra o trecho a seguir.
Sejamos pragmáticos: um bóson de Higgs serve para quê?
Na prática, nada, além do fato de gerar massa e de ter acrescentado um pingo no cabedal de conhecimento dos humanos sobre a natureza.
Mas, então, por que gastar bilhões e bilhões de dólares para detectar algo que não serve para nada e nem mesmo se vê? Resposta: não, sua vida não mudará um milímetro por causa do Higgs. Mas mudará — e já mudou muito — por causa do que foi feito para descobrir o Higgs e outras partículas.
Vejamos por quê.
Da descoberta do elétron em 1897 por Joseph John Thomson (1856-1940), passando pela formulação da teoria quântica por Max Planck (1858-1947), pela relatividade e pelo efeito fotoelétrico de Albert Einstein (1879-1955), pelo enigmático e obscuro teorema da desigualdade de John Stewart Bell (1928-1990), que fundamentou os primeiros experimentos de teletransporte, e por tantas outras descobertas da física, essa mesma abordagem didática e simples também apresenta o trabalho de César Lattes (1924-2005), José Leite Lopes (1918-2006), Jayme Tiomno (1920-2011) e outros importantes cientistas brasileiros.
Simplicidade
Doutor em história da ciência em 2009 pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Cássio quase concluiu a graduação em física na USP enquanto estudou jornalismo na Cásper Libero, já mergulhando de cabeça em sua dedicação à ciência. Tive o prazer de ser seu colega entre o final dos anos 1980 e início dos 1990 na Folha. Mesmo com o desconto pela amizade, meus elogios aqui ao trabalho dele não chegam à altura de sua bagagem intelectual e sua excelência no trabalho de divulgação científica.
Uma boa parte desse material foi publicada na Folha nos cadernos dominicais Mais! e seu sucessor Ilustríssima. E muito foi divulgado também pela “Scientific American Brasil” (da qual atualmente sou editor), “Piauí”, “Revista de História da Biblioteca Nacional”, “Ciência e Sociedade”, “Pittacos”, “Caderno Brasileiro de Ensino de Física” e “Jornal da Semana de C&T”.
A contribuição de Cássio Leite Vieira para a divulgação científica brasileira não tem acontecido apenas por meio de seus artigos, reportagens e resenhas, mas também como um consultor e colaborador informal de muitos jornalistas e veículos de comunicação. Na verdade, tão grandes quanto sua paixão pela ciência e sua excelência profissional são sua generosidade e seu desprendimento — sempre marcados por sua simplicidade — em sua constante atenção com os que buscam sua orientação e sua colaboração.
Parabéns ao CBPF (Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas), do Rio de Janeiro! Não só por ter publicado essa obra, editada inicialmente para os alunos da 10ª Escola do CBPF, mas também por tê-la disponibilizado para download gratuito, no mesmo espírito da generosidade de seu autor.